Após o recesso do Congresso, em agosto, acontece a votação da proposta de privatização dos Correios. A equipe do ministro Paulo Guedes quer ainda publicar o edital até o fim do ano e realizar a operação até março de 2022.
Augusto Aras, procurador geral da República, já afirmou que a privatização dos serviços postais e do Correio Aéreo Nacional não deveria ir adiante por ser considerada inconstitucional: a Constituição da República de 1988 estabelece que compete à União manter o serviço postal e o Correio Aéreo Nacional, sendo dessa forma o Governo que deve executar e explorar o serviço.
"O inciso X do artigo 21 da Constituição Federal não possibilita a prestação indireta dos serviços postais e do Correio Aéreo Nacional. A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT – até poderia ser cindida, com a desestatização da parte da empresa que exerce atividade econômica", diz Aras.
Já para João Beck, economista e sócio da BRA, escritório credenciado da XP Investimentos, "dependendo do modelo de privatização, o evento pode acabar gerando um órgão regulador que atue como xerife do grupo empresarial que comprar os Correios. Como toda privatização, principalmente por ser uma empresa da esfera federal e também por se tratar de um serviço comum de utilização da população, a politização do tema é enorme e contraproducente.
Para Jansen Costa, sócio da Fatorial Investimentos, o ano de 2022 é de eleições no Brasil, o que pode dificultar que a proposta de privatização seja aprovada. "Caso esse processo aconteça, será bem demorado que vai levar anos, pois envolve muita complexidade em toda a operação", afirma.
Quando o assunto são os presídios, em sessão ontem, o Instituto dos Advogados Brasileiros já se manifestou contrário não só à privatização, mas também à adoção do regime de cogestão e de parcerias público-privadas destinadas a transferir do Estado para a iniciativa privada a administração das penitenciárias.
"A privatização do sistema prisional tem como mote somente o lucro", afirmou na sustentação oral do parecer o relator Leonardo Villarinho, da Comissão de Direito Penal.
Os relatores informaram que, segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), a população carcerária do país saltou de 90 mil presos, na década de 1990, para quase 760 mil, em 2020. Eles também forneceram dados do Relatório da Pastoral Carcerária, de 2014, segundo os quais o custo com um preso num presídio público, naquele ano, girava em torno de R$ 1,4 mil mensais, enquanto numa unidade prisional privatizada chegava a cerca de R$ 3 mil por mês. O presidente da Comissão de Direito Penal, Marcio Barandier, disse na sessão que, "com tais custos, a terceirização da administração do sistema prisional acaba se apresentando como um grande negócio".
Na sustentação oral do parecer, o também relator Sergio Graziano Sobrinho defendeu que "a terceirização do sistema deve se restringir à prestação de serviços de assistência médica, fornecimento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas" De acordo com ele, a privatização, a cogestão e a parceria público-privada estão dentro do que é chamado de "terceirização", mas somente as duas últimas têm sido adotadas. No parecer, os relatores apontaram outros dados do relatório, segundo os quais, em 2014, havia cerca de 30 prisões administradas pela iniciativa privada em oito estados e que concentravam cerca de 20 mil presos.
Os advogados também apontaram violações constitucionais na privatização do sistema prisional: "A medida viola os princípios da igualdade e da dignidade, ao condicionar os direitos do preso, como ao livramento condicional, à progressão de regime e à saída temporária, à aferição de bom comportamento por uma empresa privada que administra a prisão".
Os relatores mencionaram ainda o previsto no art. 175 da Constituição Federal. Conforme o artigo, "incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos". Com base no dispositivo, os relatores destacaram que "em regra, o serviço público deve ser prestado pela Administração Direta, por meio de seus órgãos e agentes".
Os advogados fizeram, por fim, um resumo histórico do processo de privatização dos presídios no mundo. Eles informaram que a proposta de terceirização da administração do sistema penitenciário se fortaleceu a partir dos anos 1980 em países como os EUA e Inglaterra. De acordo com os relatores, a ideia ganhou espaço no Brasil, na década de 1990, "em razão do aprofundamento dos problemas prisionais, especialmente a superlotação dos estabelecimentos penais em face das políticas de segurança pública focadas no encarceramento em massa, que resultam em rebeliões, fugas, denúncias de corrupção e violência interna".
Fonte: Monitor Mercantil
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Não deveria fazer juízo de valor